Com crise na Grécia, está em jogo a identidade da Europa. Questionados se a Grécia deveria ir à falência em vez de se submeter a mais medidas de austeridade, muitos dizem já viver uma falência.
A reportagem é de Maria Margaronis e publicada pelo The Guardian e reproduzida pelo jornal Folha de S. Paulo, 13-02-2012.
A seis centímetros do escudo policial para conter o tumulto do lado de fora do Parlamento grego na última sexta-feira, um rapaz alto, pálido, gritava com um homem que poderia ser seu tio.
"É a sua geração que nos trouxe a este ponto, mas é a minha que vai ter de pagar. Vocês têm que se responsabilizar pelo que está acontecendo", bradava.
Enquanto escrevo, o Parlamento grego se prepara para votar o acordo com os credores privados do país e um novo acerto com a União Europeia e o FMI.
Eles vão emprestar ao país € 130 bilhões em troca de cortes que esfolam os últimos pedaços de carne da economia grega - incluindo uma redução de 22% no salário mínimo e 150 mil cortes de empregos públicos até 2015.
Sem o acordo, a Grécia vai à falência em março; com a qual o país deve afundar em uma depressão profunda sem luz no fim do túnel.
Quando se pergunta a pessoas nas ruas se a Grécia deveria ir à falência em vez de se submeter a mais medidas de austeridade, muitos dizem já viver uma falência, que os servidores públicos não recebem salários há meses e hospitais não têm suprimentos.
Por que, então, ampla parcela da elite grega se apega tão fortemente à fantasia de que um novo empréstimo pode "salvar" o país?
A resposta óbvia é que o calote é um buraco negro e um risco enorme.
A outra é que a safra atual de políticos construiu suas carreiras no sistema que está em colapso, baseado em oligarquias, clientelismo e corrupção e que não fez as reformas que poderiam ter revivido a economia grega e sua democracia.
As razões mais profundas, porém, podem ser culturais e políticas. A crise intensificou velhas rixas da sociedade.
Fazem-se paralelos históricos. Tanto a esquerda quanto a direita falam de uma nova ocupação alemã -referência compreensível dado que a Alemanha está dando as cartas agora, mas algo que pode cair no racismo.
Para o centro liberal, a Europa ainda é o coração da Grécia, o único garantidor do capitalismo liberal, dos direitos humanos e da democracia.
O problema com as metáforas históricas é que elas podem obscurecer o presente: o que está em jogo aqui não é a identidade da Grécia, mas a da Europa.
Todos os olhos estão fixos em Atenas, mas o caminho para fora da crise exige uma escolha sobre que tipo de Europa queremos.
A que temos agora, com suas profundas desigualdades estruturais e sua rígida ideologia econômica, não protege nem a democracia nem os direitos humanos. Punitiva e linha-dura, prefere comer seus filhos.
Fonte: IHU/Unisinos
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