“A solidão é o retrato sem reparo ou fotoshop do fracasso humano. A forma mais cruel e indigna de ser enterrado antes que os olhos se fechem para a eternidade do pó originário. A solidão é a poeira dispersa no caos de uma existência de quem de tanto (ou talvez de não, direito) amar, nem saber-se amado, perdeu-se na escuridão da alma. Pior, talvez, seja o destino de quem desiste do amor, a menos que amor não seja ou sinta, fechando os olhos à imediatidade das regras e do querer absoluto. Deveria haver uma lei que severamente punisse quem, por sua renúncia, condena outro ser, amado ou nem tanto, à tortura de ser só. Triste a solidão, triste sepulcro esse de um morto ainda vivo. Não deixe, por tudo, que as flores premiadas despetalem seu último perfume. Nem as lance sobre o jazigo por um telefonema ausente ou tente decifrar os sonhos intempestuosos. Apenas as regue com sorriso terno e deixe a luz entrar”. (Luc de Leben).
Embora ainda sem muito efeito prático, o Supremo Tribunal Federal tem feito menção, por expressa referência à construção alemã, à proporcionalidade como vedação de excessos e como proibição de insuficiência na atuação estatal. A orientação é capitaneada pelo Ministro Gilmar Mendes. Na dogmática alemã, escreveu ele, “é conhecida a diferenciação entre o princípio da proporcionalidade como proibição de excesso (Übermassverbot) e como proibição de proteção deficiente (Untermassverbot)”.
No primeiro caso, segue na lição, “o princípio da proporcionalidade funciona como parâmetro de aferição da constitucionalidade das intervenções nos direitos fundamentais como proibições de intervenção. No segundo, a consideração dos direitos fundamentais como imperativos de tutela (Canaris) imprime ao princípio da proporcionalidade uma estrutura diferenciada”. As máximas da adequação, necessidade e proporcionalidade estrita se aplicam também à proporcionalidade estrita.
O ato não será adequado, ainda na visão de Gilmar, “quando não proteja o direito fundamental de maneira ótima; não será necessário na hipótese de existirem medidas alternativas que favoreçam ainda mais a realização do direito fundamental; e violará o subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito se o grau de satisfação do fim legislativo é inferior ao grau em que não se realiza o direito fundamental de proteção” (ADI 3112/DF). No caso das células-tronco, voltou com a tese, ao afirmar que o artigo 5º da Lei de Biossegurança (Lei 11105/2005) violava o princípio da proporcionalidade como proibição de proteção insuficiente, por não prever um órgão central, vinculado ao Ministério da Saúde, para análise, aprovação e autorização das pesquisas e terapia com células-tronco originadas do embrião (ADI 3510/DF).
O Ministro Ricardo Lewandowski também já afirmou que “o princípio da proporcionalidade, bem estudado pela doutrina alemã, correspondente a uma moeda de duas faces: de um lado, tem-se a proibição de excesso (Übermassverbot), e, de outro, a proibição de proteção deficiente (Utermassverbot)”. E aplicou-as à discussão em torno da gratuidade, determinada por lei, ao registro civil de nascimento e óbito. Não me parece, disse, “que os dispositivos legais impugnados incidam na proibição de excesso, porquanto os notários e registradores exercem tantas outras atividades lucrativas que a isenção de emolumentos neles estabelecida certamente não terá o condão de romper o equilíbrio econômico-financeiro das serventias extrajudiciais, de maneira a inviabilizar a sua continuidade”.
Viu, ademais, na determinação legal cumprimento das exigências do lado B da proporcionalidade, que obriga o Estado a proteger de maneira eficaz os “economicamente hipossuficientes, sobretudo no que respeita aos seus direitos de cidadania” (ADI 1800). Ficamos à espera de novos desdobramentos dessa espécie de proporcionalidade. Se o Tribunal levá-la à prática, poderemos ter um ativismo judicial importante em matéria de direitos sociais de prestação. É esperar para ver.
Um comentário:
Recentemente o mesmo Supremo, na pessoa do mesmo Gilmar Mendes, pronunciou-se acerca da possibilidade de deferimento de tratamentos médicos, em casos levados a juízo, com base, ainda que implícita, no mesmo raciocínio. Penso apenas que, argumentativamente, estamos a dar um passo cego na direção de uma racionalidade cartesiana, tão falha e ocultadora de decisionismos. Por certo que não apenas o tão amaldiçoado método possibilita esse mal. O problema é a crença cega que, infelizmente, continua a convencer os sete cantos do mundo, no sentido de que o tal princípio (em sua modalidade adequação, necessidade e pronderação) verdadeiramente promova a efetivação de Direitos Fundamentais e contribua para a consolidação de uma Democracia Constitucional (paradoxo que não se anula, mas é condição recíproca de existência). Será que, contra Gadamer, continuaremos eternamente presos aos métodos? Estamos fadados a isso? Infelizmente, parece que sim...
Postar um comentário