Dois recentes casos envolvendo grandes corporações nacionais colocaram em xeque o uso da arbitragem como meio de solução de conflitos entre empresas. A disputa societária entre as famílias Odebrecht e Gradin e a briga entre o empresário Abílio Diniz, dono do Pão de Açúcar, e o seu sócio Casino levantaram dúvidas no mercado sobre a eficiência desse mecanismo em eventuais discordâncias entre as partes envolvidas.
A possibilidade de uso da arbitragem para a solução de conflitos entrou em vigor no Brasil em 1996, quando foi permitida por lei. A partir daí, passou a ser amplamente usada pelas empresas nacionais e estrangeiras com negócios no país para evitar a morosidade do Poder Judiciário. Hoje, a maior parte dos acordos de acionistas das empresas inclui cláusulas de arbitragem, o que garante maior segurança jurídica aos investidores.
Fontes do mercado financeiro e advogados ouvidos pelo Valor defenderam a arbitragem como a forma mais segura de se resolver conflitos em um ambiente empresarial. Essas mesmas fontes informaram que ainda é cedo para saber se os dois casos recentes podem comprometer futuros investimentos no país, mas acreditam que, em geral, as empresas que desrespeitam o mecanismo quando previsto nos contratos podem ter sua imagem abalada. "Esses casos começaram a criar um clima de insegurança em relação à ferramenta", afirma uma fonte à reportagem. "Como assim, vendeu e não entregou?", disse, referindo-se ao caso Pão de Açúcar. "Fundos de investimentos estrangeiros começaram a ligar para entender o que estava acontecendo. Isso gera dúvidas sobre a segurança jurídica em relação aos contratos."
Segundo essa mesma fonte, que trabalha em um banco de investimentos e preferiu não se identificar, na hora em que as pessoas começam a ouvir casos como os que envolveram o Pão de Açúcar e o Casino e as famílias Odebrecht e Gradin começam a se perguntar "se as cláusulas de arbitragem inseridas em seus contratos têm mesmo validade". De acordo com a fonte, recentemente um advogado estrangeiro optou por inserir, no contrato em negociação, uma cláusula estabelecendo que ele seria regido pela legislação de Nova York e que, no caso de conflitos, eles seriam julgados pela Justiça americana. "A arbitragem é até hoje contestada, e agora surgiram esses casos", diz. "O risco agora é o de jogar a arbitragem no lixo."
Para a advogada Ana Claudia Pastore, vice-presidente do Conselho Arbitral do Estado de São Paulo (Caesp), a inserção de cláusulas de arbitragem é uma alternativa à Justiça estatal. "Empresas estrangeiras, de uma maneira geral, sempre tiveram receio de fazer investimentos no país por conta dos problemas legais", afirma. O mercado, segundo ela, poderá não entender a mensagem passada por uma empresa que estabelece regras incluindo cláusula de arbitragem, mas acaba voltando atrás. "Isso cria um clima de instabilidade", diz Ana Cláudia. "Caso se decida pelo uso da Justiça estadual, pode-se gerar uma interpretação, para o mercado, de um ambiente de insegurança e instabilidade."
No processo em curso na Justiça da Bahia, a Kieppe argumenta que a arbitragem é apenas uma das possibilidades previstas no acordo de acionistas. A empresa anexou ao processo três pareceres encomendados aos juristas Humberto Theodoro Júnior, Cândido Rangel Dinamarco e Nelson Nery Júnior em que eles corroboram sua tese de que o uso do método não é obrigatório, e que a via judicial é uma alternativa.(CP e MS)
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