Whenever you doubt my love, it loses some of its substance (L.D)
Quando menino, sentia uma especial atração por um livro de cabeceira de uma tia: O Corpo Fala. Escondido, li e reli o livro e outros do gênero que ela guardava na escrivaninha. Curiosamente, minha tia nunca foi exímia comunicadora. Boa professora de artes e talentosa com as tintas, não conseguiu fazer grandes amizades e, talvez o pior, extraviou-se no amor.
Por mais que aprendamos com os textos, a linguagem é sempre traiçoeira. Não importa se escrita ou gestual. A plena vigilância de quem fala não é garantia contra os seus deslizes. Entretanto, minha tia tinha razão na insistência. Há, por trás de nossa comunicação verbal, um diálogo subliminar que nos convence tanto ou mais do que as palavras.
Os marqueteiros eleitorais sabem bem disso. E procuram transformar seu produto eleitoral em sucesso de voto. A democracia, no passado, era a arte da oratória. Hoje é, dentre outras coisas, o mundo da imagem e dos sinais. Mas para um espectador atento, os atos-falhos são constantes.
Mãos e braços que desmentem a afirmação, expressões faciais que mostram desconfortos e distorções. O debate e entrevistas com os presidenciáveis são um repertório de exemplos dos esforços dos profissionais para conter seus produtos no catálogo dos mais vendidos, mas também dos descuidos da consciência e da vigilância dos candidatos.
É difícil, entretanto, saber o quanto esse discurso quase invisível aos nossos olhos influencia o resultado das eleições. Continuo a acreditar que convence os eleitores tanto ou mais do que um projeto programático bem feito. Se, por outro lado, tomar o exemplo da minha tia como referência, diria que pouco ou nada interfere.
Mas há um equívoco em minha conclusão. A solidão em que minha tia vive é o destino de muitos, se não de todos. Não é resultado do fracasso da comunicação. Falo dessa solidão que mora ao nosso lado como única companheira do nascimento à partida. Uma praga insolúvel da condição humana.
Não há como debitá-la ao desconhecimento da linguagem corporal ou psíquica. Nem evitá-la por seu pleno domínio. É um estado anímico irredutível a gesto ou palavra ou à multidão, solidão mais ontológica e absoluta. Talvez seja ela que esteja por trás de todo desentendimento como um projeto contrailuminista de vida: a autopreservação vem antes da alteridade; o egoísmo é mais forte do que o amor.
Noves fora o pessimismo existencial, é preciso assistir aos debates políticos à procura das reais intenções dos candidatos. Quem sabe a vida pública não seja diferente da vida privada. O discurso antecipe a ação e a mudança. O corpo fala e nem sempre a mente atrapalha. A felicidade pública talvez nos espere adiante, marketing político à parte.
Temos que insistir na busca, até mesmo do projeto de felicidade pessoal, pois como disse Ashley Hodgeson a repetir milhões de vozes, fortes não são os que vencem, mas os que não desistem quando são derrotados.