A ciência será obrigada a deixar de utilizar na Europa os grandes símios [chimpanzés, gorilas e oragotangos] em seus experimentos e terá que limitar ao máximo, de acordo com regras rígidas, o uso de outros animais, em uma decisão aprovada pelo Parlamento Europeu após dois anos de intensas negociações.
Parlamento Europeu decidiu que as experiências com animais devem ser substituídas, na medida do possível, por método alternativo cientificamente satisfatório
A nova regra proíbe o uso de chimpanzés, gorilas e orangotangos em experimentos científicos, enquanto o uso de outros primatas será objeto de uma "restrição estrita".
A Eurocâmara aprovou, em termos gerais, que as experiências com animais sejam substituídas, na medida do possível, por um método alternativo cientificamente satisfatório.
Os cientistas terão que trabalhar para que "a dor e o sofrimento infligidos sejam reduzidos ao mínimo", afirma o texto aprovado em sessão plenária pelo Parlamento Europeu, com sede em Estrasburgo (França).
A norma, que tem prazo de dois anos para ser adotada pelos Estados europeus, completa uma lei aprovada em 2009 que proíbe os testes de produtos cosméticos em animais.
Mas o texto desagradou tanto os defensores de uma abolição total como os favoráveis à causa científica. "O progresso da medicina é crucial para a humanidade e, infelizmente, para avançar é necessára a experimentação animal", afirmou o eurodeputado conservador italiano Herbert Dorfmann.
Já a eurodeputada parlamentar belga Isabelle Durant, verde, afirmou que "é possível reduzir o número de animais utilizados com fins científicos sem prejudicar a pesquisa".
Para Antoniana Ottoni, representante no Brasil da Animal Defenders International (ADI), organização não governamental inglesa que defende os direitos dos animais, a nova lei europeia apresenta avanços e retrocessos. “Se por um lado ela diz, em vários pontos, que seu objetivo final é a eliminação total da experimentação animal, por outro, ela libera seu uso em algumas situações, com um tom mais regulatório e menos proibitivo”, afirma a advogada. “Mas, de qualquer forma, ela traz avanços, já que a ciência é muito pouco aberta para as pesquisas sem animais”, opina.
De acordo com a ativista, a ciência deve dar mais atenção a outras formas de pesquisa. “Há centenas de anos utilizamos os animais em pesquisas, e há apenas poucas décadas essa questão é debatida. Não podemos dizer que essa é a única forma de fazer ciência, se não olharmos para o lado em busca de novos caminhos”, afirma. “É mais fácil e muito mais barato fazer pesquisa com animais. Para a eliminação desse tipo de experimento, é preciso que haja uma mudança de paradigmas da ciência, e isso não é fácil”, completa.
Mesmo concordando com Antoniana sobre a pertinência da nova legislação europeia, o professor Volnei Garrafa, da Cátedra Unesco de Bioética da Universidade de Brasília (UnB), acredita que a experimentação animal ainda deve ser mantida. “Toda forma de regulação é pertinente. Acredito que esses dispositivos são importantes para se eliminar abusos contra os animais, como o tratamento cruel e o uso excessivo e desnecessário de cobaias. No entanto, nós humanos estamos em outro grau, e temos uma espécie de primazia na natureza. Então, desde que respeitados certos princípios, a experimentação deve sim ser mantida”, acredita.
O professor da UnB aponta no controle rígido de que tipos de experimentos são permitidos, o caminho mais ético no tratamento dos animais. “No passado, alguns dos experimentos que fazemos hoje em cobaias eram feitos em humanos, e uma evolução ética eliminou essas práticas. Assim, se não fossem feitas em animais, certamente as pesquisas não conseguiriam avançar tanto quanto avançam hoje, e certamente a população seria prejudicada”, completa Garrafa.
Quase 12 milhões de animais são utilizados a cada ano com fins experimentais na UE. Segundo os especialistas, o estado atual do conhecimento científico não permite a supressão total do uso.
A
Lei n. 11.794/2008 restringe o uso científico de animais vertebrados, como ratos e camundong. Apenas instituições de ensino superior e estabelecimentos de educação profissional técnica de nível médio da área biomédica poderão usar animais em experiências científicas.
São consideradas atividades de pesquisa científica, segundo a norma, as relacionadas com ciência básica, ciência aplicada, desenvolvimento tecnológico, produção e controle da qualidade de drogas, medicamentos, alimentos e outros testados em animais. Não são atividades de pesquisa as práticas zootécnicas relacionadas à agropecuária.
A Lei também criou o
Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal (Concea), que tem como finalidade fiscalizar o cumprimento das regras, credenciar instituições para criação ou utilização de animais em ensino e pesquisa científica e monitorar e avaliar a introdução de técnicas alternativas que substituam a utilização de animais em ensino e pesquisa, entre outros. Somente as instituições credenciadas no Concea poderão utilizar animais como cobaia.
As instituições que desrespeitarem a lei estão sujeitas a multa entre R$ 5 mil e R$ 20 mil, além da interdição temporária e até definitiva. Apesar de a lei ter sido publicada hoje, foi dado o prazo de 180 dias para que todas as mudanças sejam realizadas.
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