L de Lusitano
Provavelmente por uma dificuldade de comunicação, o respeitadíssimo António Lobo Antunes , conhecido como ‘o rival de Saramago’, acabou fazendo valer a piada do português. Questionado sobre quais obras gostaria de ter escrito, ele respondeu: “À parte as minhas?”. (Shin Oliva Suzuki, G1).
Os mistérios do desejo
A psicanalista Maria Rita Kehl precisou se conter para não transformar a mesa As sem-razões do amor numa sessão de psicanálise: Cathérine Millet é um prato cheio para qualquer divã. É verdade que, em alguns momentos, Maria Rita não resistiu à tentação de enveredar por um jargão ligeiramente fora de lugar, cheio de “interditos” e “recalcados”, o que me parece uma forma involuntária de fugir do assunto que, afinal de contas, realmente interessa nos livros da escritora: as suas aventuras sexuais. Ainda assim, Cathérine, cuja expressão angelical não cansa de me impressionar depois do que li, disse coisas interessantíssimas, a propósito de seus dois livros, A vida sexual de Cathérine M. (surpeendentemente esgotado: me parece que a editora comeu mosca) e A outra vida de Cathérine M. (Jour de souffrance, no original).
Exemplos:
“A minha crise de ciúme passou quando me dei conta de que eola me dava um prazer masoquista.” “Não existe ciúme verdadeiro que não seja sexual. A crise não teve nada a ver com amor, sentimento que não estava em questão na minha relação.” “Sempre tive um duplo olhar sobre as coisas: quando eu tinha relações sexuais, eu via os meus parceiros, mas também via a mim mesma na cena. Isso cortava um pouco o meu prazer, porque penso que o prazer sexual intenso depende de um abandono total. Mas talvez esse outro olhar que me acompanha sempre seja, justamente, o olhar do escritor.” “Pratiquei muito sexo grupal, em clubes ou com grupos de amigos, mas continuei tendo meus tabus. Justamente imaginar Jacques Henric fazendo amor com outra mulher era algo inconcebível. Mas era nisso que eu pensava quando me masturbava.”
“Não escrevo para me curar de alguma coisa, mas para me desembaraçar de mim mesma. A escritura apaga a memória primária das coisas, a ponto de eu não ter mais certeza de ter vivido tudo aquilo sobre o que escrevi.”
“A liberdade sexual foi algo natural para mim, entrei nela como num jardim cheio de flores perfumadas. Meus pais brigavam muito, e minha mãe tinha um amante. Desde cedo percebi que a família não era um valor absoluto. Então não se tratou de uma transgressão contra pais tradicionais”. (Luciano Trigo, Máquina de Escrever).
Cultura para humanizar as cidades
Logo após os lixeiros terem varrido as ruas do centro histórico (em Parati, isso é uma operação complicada), o domingo de São Pedro começou como uma sessão diferente de todas as demais na Tenda dos Autores. Nada tinha a ver com literatura, mas dizia respeito diretamente à própria FLIP. Era um painel, com quatro convidados, no qual se discutiu “como a cultura desenha a cidade”. Ou seja, pretendia-se falar sobre possíveis políticas públicas em favor de Parati, além do que já tem sido feito sob o influxo da FLIP, com base em experiências em curso em outras cidades.
O nome da sessão, “Mesa Zé Kleber”, homenageava um poeta e ativista que viveu em Parati até o seu falecimento, em 1989, e que também está sendo retratado em uma exposição na Casa da Cultura. O evento da manhã de domingo, que teve a mediação da antropóloga Paula Miraglia, pesquisadora sobre violência urbana, contou com as presenças de Jorge Melguizo Posada, secretário do desenvolvimento social da cidade colombiana de Medellín; de Denis Mizne, do Instituto Sou da Paz; e de Carlos Augusto Calil, secretário municipal da cultura de São Paulo. “A pessoas têm fome de cultura”, afirmou Calil. “Há uma demanda reprimida no Brasil.”
Para ilustrar essa ideia, ele contou da revolta de uma moradora de um bairro periférico, anos atrás, que queria mas não pôde devolver um livro e pegar outro na biblioteca circulante instalada em um ônibus que circulava pela cidade. Era o único veículo que de que a prefeitura dispunha para isso, na época, e tinha trinta anos de uso.
Naquele dia, quebrou. E aquela moradora, indignada, acabou dando um depoimento à televisão e, com isso, mobilizou a prefeitura para expandir o serviço. Hoje já são quatro ônibus-biblioteca, mas Calil quer mais, acha que isso ainda é pouco para o tamanho de São Paulo.Melguizo, de sua parte, vem de uma cidade de 2,3 milhões de habitantes (3,5 milhões na área metropolitana) que já foi considerada uma das mais violentas do mundo. A trágica situação de Medellín começou a mudar a partir de um projeto que previa a construção de bibliotecas e complexos esportivos nos bairros mais problemáticos.
Segundo dados fornecidos por Melguizo, o percentual do orçamento público dedicado à cultura passou, desde cinco anos atrás, de 0,6% para 5%. São instalações amplas e modernas, em áreas que equivalem às favelas brasileiras. As bibliotecas abrem fecham apenas dois dias por ano. O governo municipal equipara as atividades ligadas à área cultural ao serviços básicos como por exemplo os de saúde, segurança e recolhimento do lixo.
Já Mizne defende a ação cultural como uma maneira de integrar os diversos públicos que compõem uma população urbana. Ele critica o modelo compartimentado que hoje existe nas metrópoles. “As formas de cultura que surgem nas periferias ainda ficam presas dentro de um gueto. Vivemos em vilazinhas medievais, sempre em busca de pessoas que são parecidas conosco.” (Organizadores da Flip).
Leia mais:
http://www.flip.org.br/noticias_2009.php?id=480
http://colunas.g1.com.br/maquinadeescrever/
Entrevista com Gay Talese (em inglês):
Um comentário:
José Adércio, Paulo Werneck, segundo Sérgio Rodrigues do blog TODOPROSA, teria apelidado o Lobo de "turrão de açúcar". Concordo com o que o Lobo disse sobre a obra do Paulinho Mendes Campos. Que venham mais Flips! Que vontade danada de estar lá... Dei uma 1ª olhadinha no seu blog e gostei demais. Voltarei, com calma, pra saborear... Adorável vc ter entrado na insanidade dos blogs, ou na gostosura...(rs) Depende, claro, do ponto de vista! Bem-vindo. Abraço da Vivi.
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